segunda-feira, 21 de março de 2011

O menino da sua mãe

Este é um poema triste para se publicar no dia mundial da poesia... mas nem por isso deixa de ser poesia. Ele está aqui com um interesse prático: os alunos do 4.º Ano da EB1 de Carvoeiro estão a falar sobre os descobrimentos portugueses. A esse propósito, iremos apresentar Endechas a Bárbara Escrava, de Luís de Camões, que nos fala de uma escrava que o poeta conheceu no Oriente ou em Moçambique, e (se tivermos tempo) também este O menino da sua mãe, de Fernando Pessoa


O menino da sua mãe
No plaino (=planície) abandonado
Que a morna brisa aquece,
De balas trespassado-
Duas, de lado a lado-,
Jaz morto, e arrefece.


Raia-lhe a farda o sangue.
De braços estendidos,
Alvo
(=branco), louro, exangue (=sem sangue),
Fita com olhar langue
(=mole, desfalecido)
E cego os céus perdidos.


Tão jovem! Que jovem era!
(agora que idade tem?)
Filho único, a mãe lhe dera
Um nome e o mantivera:
«O menino de sua mãe.»


Caiu-lhe da algibeira
A cigarreira breve.
Dera-lhe a mãe. Está inteira
E boa a cigarreira.
Ele é que já não serve.


De outra algibeira, alada (=com asas, como uma asa)
Ponta a roçar o solo,
A brancura embainhada
De um lenço… deu-lho a criada
Velha que o trouxe ao colo.


Lá longe, em casa, há a prece:
“Que volte cedo, e bem!”
(Malhas que o Império tece!)
Jaz morto e apodrece
O menino da sua mãe


Fernando Pessoa

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